Nos Estados Unidos, a remuneração e carreira por habilidades é uma das inovações gerenciais que mais cresceu em popularidade nos últimos anos. Esse crescimento foi consequência das pressões internas e externas sofridas pelas empresas, o que as têm levado a repensar seus modelos de gestão e suas filosofias de remuneração e carreira.
No Brasil, embora ainda seja novidade para a maioria das empresas, o número de casos de aplicação da remuneração e carreira por habilidades, também, têm crescido.
A remuneração por habilidades costuma receber diferentes nomes nas empresas que a utilizam. Os mais comuns são remuneração por conhecimento, remuneração por habilidades certificadas, ou, simplesmente, remuneração por habilidades. Nos Estados Unidos, os nomes mais utilizados são: pay-for-knowledge, knowledge-based-pay, multiskill compensation, pay-for-skill e job enrichment progressions.
O surgimento dessa forma de remuneração é consequência do aumento de complexidade do ambiente de negócios, que resultou em uma série de tendências registradas desde os anos noventas nas organizações.
De forma sintética, uma habilidade pode ser definida como a capacidade de realizar uma tarefa ou um conjunto de tarefas em conformidade com determinados padrões exigidos pela organização.
Uma habilidade pode ser caracterizada pelos seguintes elementos:
Conhecimentos: constituem um conjunto de conceitos, técnicas, teorias e metodologias relacionadas ao trabalho. É o saber adquirido, que pode ser transmitido e aprendido.
Aptidões pessoais: relacionam-se às características do indivíduo, tais como capacidade de concentração e coordenação motora.
Aplicação prática: relaciona-se à mobilização dos conhecimentos teóricos e das aptidões pessoais, aplicados ao trabalho.
Tomemos como exemplo a atividade de dirigir um automóvel. Esta é uma habilidade que envolve: primeiro, o conhecimento teórico das leis de trânsito e do funcionamento geral de um automóvel. Segundo, algumas aptidões pessoais como coordenação motora, atenção concentrada e destreza; e terceiro, a aplicação prática dos conhecimentos e das aptidões, que ocorre no momento no qual se combinam e se aplicam os conhecimentos e as respectivas aptidões na prática.
Em uma planta de produção seriada, têm-se habilidades como operar um torno, realizar auditorias de segurança e realizar manutenção preventiva em prensas. Em um laboratório, têm-se habilidades como realizar análises de recebimento de matérias-primas, inspecionar amostras do produto final e aferir equipamentos.
As habilidades são determinadas de acordo com a realidade de cada organização.
Para a construção de um plano tradicional de cargos e salários há uma linha de atuação consolidada. Consultores e profissionais de recursos humanos dispõem de metodologias para definição e avaliação de cargos, comparação com mercado e administração do sistema.
A adoção de um sistema de remuneração e carreira por habilidades, entretanto, por estar alinhada às estratégias e características da organização, não permite a consolidação de um modelo único e genérico para sua construção e implementação. Fundamentalmente, o sistema deve retratar a realidade da empresa, diferenciando-o significativamente de um sistema tradicional.
Nos sistemas de remuneração tradicionais, os salários são vinculados aos cargos. Estes são avaliados de acordo com um conjunto de fatores, como responsabilidade, escolaridade e autoridade. Por sua vez, o sistema de remuneração e carreira por habilidades exige uma abordagem mais dinâmica.
Em sistemas tradicionais, o conceito de carreira está relacionado a uma evolução vertical na hierarquia, e o esforço de desenvolvimento pessoal nem sempre tem contrapartida em termos de evolução de carreira ou de salário. No sistema de remuneração e carreira por habilidades a progressão tende a ser horizontal; isto é, o colaborador evolui profissionalmente por meio da aquisição, do desenvolvimento e da aplicação de habilidades formalmente preestabelecidas e avaliadas pela organização. Empregados que adquirem habilidades relacionadas a diferentes funções tornam-se mais valiosos para a empresa e têm mais possibilidades de evolução.
A senioridade, que tem um papel central nos sistemas tradicionais, passa a ser um fator secundário, já que a evolução da carreira e do salário não está mais vinculada ao tempo na função ou cargo. A evolução na carreira será determinada por dois fatores:
Primeiro, pelas necessidades da organização e das equipes de trabalho. Isso inclui a definição do nível de multifuncionalidade e da estratégia de capacitação de recursos humanos.
Segundo, pelo esforço do próprio profissional em adquirir novas habilidades.
As habilidades adquiridas por um profissional devem refletir a demanda de habilidades para a execução dos processos sob sua responsabilidade. As habilidades individuais consolidadas por equipe de trabalho constituem um Plano Estratégico de Habilidades.
O Plano Estratégico de Habilidades deve levar em consideração quatro itens: o número exigido de habilidades por profissional, o investimento necessário em treinamento e desenvolvimento, a remuneração do conjunto de habilidades e o nível de multifuncionalidade dos profissionais.
Os sistemas tradicionais pressupõem que o profissional possua determinado conjunto de habilidades. Promoções e evolução salarial não estão vinculadas à demonstração dessas habilidades. Na remuneração por habilidades, os aumentos de salários são diretamente vinculados a um processo de avaliação, no qual o empregado tem de demonstrar a aplicação da habilidade na prática com autonomia.
O conceito de avaliação, como adotado no sistema de remuneração e carreira por habilidades, tem similaridade com as práticas de certificação de sistemas de qualidade. Nos processos de certificação pelas normas ISO, por exemplo, a empresa é submetida a uma auditoria. Ela deve provar que seu sistema da qualidade atende aos requisitos da norma. Para garantir que a empresa dê manutenção adequada ao sistema, o certificado tem tempo de validade predeterminado, após o qual uma nova auditoria deve ser realizada.
Na remuneração por habilidades, a certificação também é uma peça-chave. A certificação é um estado, um nível de proficiência que assegura que o profissional atende plenamente e com autonomia à execução de determinada habilidade. Recomenda-se que a certificação seja objeto de formalização dos resultados da avaliação no registro do profissional.
* Texto extraído e adaptado do livro Remuneração e Carreira por Habilidades e Competências, Editora Atlas,2004, 3ª edição, Organizado por Thomaz Wood Jr e Vicente Picarelli Filho.
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